"Nuvens" de "formigas com asas" na Feira do Livro

Em época de verão, as temperaturas elevadas e a humidade no ar são a mistura perfeita de condições para dar início aos “voos nupciais” destas “formigas com asas”. Mas afinal, que insetos são estes? As formigas mais comuns, da espécie Lasius, que aparecem principalmente nos jardins ou à caça de restos de comida, são as obreiras. São fêmeas não reprodutoras e responsáveis por tudo o que é essencial para a colónia, como a busca do alimento e a manutenção do formigueiro. Já as que foram avistadas em “enxames” a voar pelo Parque Eduardo VII nestes últimos fins de tarde são as rainhas e os “machos virgens”.
Quando estão reunidas “condições atmosféricas específicas”, neste caso o calor e a humidade, explica o curador da coleção de insetos do Museu de História Natural Roberto Keller, tanto as rainhas como os machos saem do ninho e começam a voar. Apesar disso, é uma espécie que não gosta muito do calor, o que explica porque se costumam manifestar ou durante a manhã ou no final da tarde, perto de sombras em zonas verdes como parques urbanos, jardins ou quintais.
As “formigas com asas” saem com o objetivo de se reproduzirem com insetos de diferentes ninhos. Os machos e as rainhas das várias colónias espalhadas pelo centro de Lisboa, neste caso, voam de uma forma “sincronizada” à procura de parceiros para se formarem novos formigueiros.
“As formigas em si não fazem absolutamente nada“, continua o especialista Roberto Keller: “Os machos não têm ferrão em nenhuma espécie de formiga — nunca picam — e as rainhas também, neste caso”. Nesta etapa do ciclo de vida destes insetos, a preocupação é “encontrar-se uns aos outros e reproduzir-se”, pelo que o “único papel” dos machos na colónia é a reprodução; os adultos morrem poucas horas depois de se reproduzirem. Após voarem e acasalarem, as rainhas “partem” as asas e escavam o solo, onde vão construir uma câmara (formigueiro) para colocarem ovos e darem início a uma nova colónia. “É a fase reprodutora da colónia e, como saem todos sincronizados dos diferentes formigueiros, que normalmente estão debaixo do passeio, nos jardins e parques, realmente não os vemos, só quando saem a voar é que reparamos que estamos rodeados de formigas”, explica.
As concentrações de “formigas com asas”, por norma, “não acontecem nos sítios onde estão milhares de pessoas”, existindo a tendência de irem “buscar um sítio onde não sejam perturbadas”. A comida é certamente um outro fator que contribui para a escolha de ponto de encontro. No caso específico da Feira do Livro, as formigas “comem de tudo”, podendo agregar-se tanto em caixotes do lixo ou onde existam restos de comida espalhados no chão, como no espaço verde entre as filas intermináveis de bancas de livros.
Não existe uma explicação concreta para as formigas se concentrarem nas roulotes que produzem um certo tipo de alimento específico — ou seja, não gostam mais de peixe ou de carne. Ainda assim, Roberto Keller acredita que estes insetos se tendam a concentrar nos locais onde num determinado momento haja menos gente — o que terá acontecido com a roulote obrigada a encerrar na segunda-feira. Uma coisa é certa: o processo “não é um fenómeno que aguente um mês”, acrescenta a entomóloga Carla Sousa, do Instituto de Higiene e Medicina Tropical. Os enxames são “muito efémeros e localizados”, “aparece e desaparece”. A vaga de “voos nupciais” pode durar entre horas a “vários dias”: mas raramente se mantém mais do que uma semana.
observador